As barreiras caíram: fortalecidos pelas mídias sociais, os consumidores estão se tornando os novos “patrões” das empresas e uma poderosa fonte de feedback. Desse modo, as empresas devem aprender como lidar eficazmente com eles, a recompensá-los e a responder positivamente às críticas online, diz o guru da gestão do relacionamento com o cliente, Paul Greenberg. Ele é o autor de CRM – Customer Relationship Management: na Velocidade da Luz – Estratégias Essenciais para Clientes no Século 21, o primeiro grande manual de gestão de relacionamento com o cliente da era 2.0, na qual o relacionamento entre as empresas e os consumidores está se movendo tão rapidamente quanto um impulso elétrico. Seu livro foi incluído pelas escolas de administração asiáticas em sua lista de leituras essenciais e se tornou um best-seller mundial. Agora ele é um guru, regularmente convidado para falar sobre sua nova forma de conceber as organizações. Por quê? Greenberg analisou o conceito de empresa pelas lentes da Internet e o reavaliou de uma perspectiva totalmente nova. Viu que os consumidores se tornaram uma comunidade de referência. Os serviços se transformaram em um pacto de duas vias entre o cliente e a empresa que tem de se renovar a cada transação. E as empresas hoje precisam se tornar marcas, apoiadas pelas constantemente conectadas redes sociais. Ele explica como a maré flutuante da Internet derrubou as barreiras dentro e em torno das empresas, redesenhando sua estrutura. “O relacionamento com os clientes hoje é circular e constante; não pode mais se limitar ao departamento de queixas. As empresas precisam de uma mudança total de atitude”, explica ele, esclarecendo que a mudança exigida é, antes de mais nada, uma mudança cultural.
De que forma?
Elas têm de considerar o relacionamento com os clientes como prioridade no mesmo patamar da própria produção e aplicar a mesma profundidade de análise.
Como assim?
O consumidor, ou melhor, a comunidade de consumidores, é uma fonte de dados, de tendências de mercado e de feedback sobre os produtos. Pode ser envolvida na produção em si e é também uma fonte de valores da marca.
Como?
Os canais tradicionais não existem mais. Temos de pensar no modelo de redes socais; a comunicação não pode mais ser de cima para baixo. Mudou e agora é entre iguais. Da mesma forma que o valor do produto e da própria empresa é negociado e aumentado ou reduzido através das redes.
É por isso que é necessário envolver o cliente?
Para começar, é necessário conhecê-lo. As empresas se comunicam continuamente com seus clientes, mas elas sabem quem são seus clientes?
Você acha que elas não sabem?
Acho que elas poderiam conhecê-lo melhor e valorizá-los e à sua presença como uma força da empresa. A tecnologia oferece novas ferramentas, e há então várias técnicas.
Pode nos dar um exemplo?
Há muitos. O primeiro método que me vem à mente é o da “co-criação”, que começou com as empresas de videogames. Para modificar um game, elas poderiam perguntar a um programador, alguém talvez muito bom para criar games, mas que nunca os jogou, ou poderiam perguntar aos usuários que jogavam o game e conheciam o produto. Perceberam que essa última abordagem era mais eficaz.
Por quê?
Para o usuário, é como um prêmio estar em contato com a administração da empresa. Para a empresa, é inestimável receber sugestões das pessoas que jogam todos os dias e que conhecem os pontos fortes e fracos do produto. O cliente ganha brindes, como games grátis ou outras recompensas, enquanto a empresa ganha uma vantagem inegável, melhor do que qualquer pesquisa de mercado.
O termo “recompensa” faz soar como um jogo.
Mas a realidade não é assim. É uma técnica para envolver as pessoas, e não é por acaso que se chama “gamificação”. Significa dar ao cliente a chance de ser recompensado por alcançar uma meta, por seguir determinadas regras.
Pode nos dar outro exemplo prático de envolvimento do cliente?
As ofertas na Amazon: se você pedir um de nossos novos lançamentos nas próximas 48 horas, ganha um desconto de 15%.
Onde está o papel ativo do cliente aí?
É uma forma de envolvimento: a oferta vem da empresa, mas é o cliente quem toma a decisão, assumindo assim um papel ativo. “Dê-me uma escolha”, é o que os clientes estão pedindo.
Então basicamente se trata de tirar vantagem do desejo do consumidor em ter um papel ativo e criativo?
Sim, mas as empresas têm de estar cientes de que o consumidor na realidade é um protagonista. Quanto mais ciente eu for, melhores os resultados que posso ter.
Quais são os efeitos positivos do envolvimento?
O cliente tem uma interação personalizada com a empresa. De acordo com a Forrester Research, 65% dos consumidores sentem a necessidade de interagir direta e imediatamente com uma marca. Mas isso não é tudo: 36% deles pesquisam na Internet para saber da reputação de uma empresa antes de comprar ou recomendar um produto.
Pode nos dar o nome de uma empresa que lidou bem com esse processo?
Veja o caso da Giffgaff.com, um aplicativo telefônico britânico para dispositivos móveis baseado inteiramente no papel dos consumidores, que são todos “patrões” na empresa.
E como funciona?
Se alguém tem problemas ou dúvidas sobre o aplicativo, pode pedir informações aos demais usuários. Os usuários que ajudam aos outros são recompensados com ligações grátis e recargas. E tem mais. Havia um orçamento limitado para publicidade quando a empresa foi fundada, de forma que não podiam fazer nenhuma campanha promocional cara.
O que fizeram então?
Lançaram uma ferramenta para compartilhar vídeos e, o mais importante, ferramentas para criar seus próprios vídeos, com prêmios para os melhores. Em um mês o aplicativo tinha 1,2 milhão de usuários conquistados somente através do boca-a-boca na Internet.
Então o compartilhamento é tudo, incluindo o compartilhamento de dados. Não é arriscado para a empresa?
O manuseio correto de dados depende principalmente do tamanho da empresa. Mas sem dúvida que a fim de se darem bem no mercado digital, as empresas precisam instalar um sistema de registro de dados que seja fácil para ela usar e consultar, e analisar frequentemente o comportamento do consumidor.
Como evitar invadir desrespeitosamente a privacidade do consumidor?
Também acredito que o consumidor tem o direito de ver todas as transações que incluam seus dados pessoais. Mas a regra geral é: “Não escreva se não quiser que saibam”.
É possível garantir a segurança dos dados dos consumidores e os próprios dados da empresa também?
O problema é que não se pode garantir de verdade. Qualquer um que diga o contrário está mentindo. Sabemos que hackers se infiltraram mesmo nos mais sofisticados sistemas de proteção de dados. O que resta é fazer o melhor para protegê-los.
Hoje em dia os consumidores podem destruir um produto e a reputação de uma empresa através das redes sociais. Não lhe parece um poder excessivo e um risco para as empresas?
É verdade, embora esse poder seja exagerado às vezes.
De que forma?
É verdade que os consumidores nunca se comunicaram tanto. E é verdade que levam a vantagem, mas só aparentemente, porque tudo depende de como a empresa reage a qualquer campanha viral negativa.
Por exemplo?
Antes de qualquer coisa, a empresa tem de saber que tipo de reputação o usuário-consumidor tem na Internet, e prestar mais atenção aos chamados “influenciadores de comunidades”. Vou dar um exemplo muito claro e absolutamente pessoal: um dia minha conta no Twitter foi bloqueada e como eu não a tinha aberto com meu e-mail, não podia fazer nada, não tinha acesso. A única saída era ligar para a assistência do Twitter. E aí veio a surpresa.
Qual foi?
O Twitter não tinha serviço de assistência técnica para usuários “normais”. Tinha apenas um para empresas que solicitassem um serviço pago. As coisas agora mudaram.
Como você resolveu o problema?
Usei outra rede social para reclamar. Expliquei o problema aos meus fãs no Facebook e um executivo sênior do Facebook enviou um e-mail a um executivo sênior do Twitter dizendo: “olha, o Paul Greenberg teve a conta bloqueada, faça alguma coisa”. Então entraram em contato comigo e disseram: “não se preocupe, vamos resolver dentro de três horas”. O Twitter ficou apavorado que o público o criticasse. Eu não fiz isso, mas agradeci aos meus fãs no Facebook por sua ajuda. Assim, o poder existe, mas seu impacto sobre a empresa depende do comportamento de seus administradores e de seu serviço de assistência.
E como reagiriam se uma reclamação viralizasse?
Nesse caso seu poder aumenta, mas menos de 1% das reclamações viralizam na Internet atualmente. Um exemplo perfeito foi o caso do músico Dave Carroll, que escreveu três canções sobre o fato de que a United Airlines havia quebrado seu violão no bagageiro e não queria reembolsá-lo. Ele postou os vídeos no YouTube.
Qual foi o resultado?
Teve 150 mil visualizações em uma semana e 5 milhões em um mês e meio, forçando a United Airlines a rever sua política. Os reembolsos agora são pagos dentro de uma semana.
Você considera que as empresas não-nativas digitais estão em desvantagem nessa nova área de negócios?
Acho que elas simplesmente têm de trabalhar com o dobro de esforço. E não existe nenhuma certeza de que todas serão capazes de administrar a mudança com sucesso. O problema para elas é a mentalidade, o que é muito mais difícil de mudar. Mas elas têm de começar.
Onde deveriam começar, em sua opinião?
Apenas reorganizar seu atendimento ao cliente em si não basta. Precisam entender que repensar as relações externas das empresas também significa mudar suas relações internas.
Então os funcionários têm de se tornar agentes ativos com a empresa também?
Sem dúvida. Intensificar as consultas ao quadro de funcionários, circular mais as ideias dentro da empresa, dar espaço às pessoas com ideias mais inovadoras. Porque uma transição nessa escala exige novas abordagens, e a ideia certa pode vir de qualquer um na empresa.
PAUL GREENBERG
Autor do best-seller CRM – Customer Relationship Management na Velocidade da Luz: Estratégias Essenciais para Clientes no Século 21, Paul Greenberg é Presidente da The 56 Group, LLC, uma firma de prestação de serviços de consultoria para aplicativos empresariais, concentrada em serviços estratégicos de CRM, incluindo estratégias go-to-market para fornecedores e integradores, planejamento estratégico de CRM e seleção de fornecedores. Foi citado como um especialista no assunto em muitas revistas e jornais nacionais, incluindo o New York Times.