Los Angeles – Enquanto assistíamos ao diretor J.J. Abrams apresentando as primeiras imagens de seu “Star Wars – O Despertar da Força” há alguns meses, na frente de uma multidão histérica de geeks e ultrafãs, não podíamos deixar de pensar que ele foi o primeiro cara que dirigiu tanto um filme de “Star Trek” quanto um de “Star Wars”. Um mestre do storytelling com um misto de entretenimento pop e uma dose forte de efeitos especiais e aperfeiçoamentos digitais: quem melhor do que Abrams para nos guiar através de um labirinto complexo e emocionante de novas tecnologias aplicadas ao cinema?
Afinal, ele é o criador de séries de TV de sucesso, repletas de suspense, como “Alias” e “Lost”, e também dirigiu filmes de alto orçamento, como “Missão Impossível 3” (2006), a nova versão de “Star Trek” (2009) e sua sequência, “Além da Escuridão” (2013), e agora também fez o novo “Star Wars” (Episódio VII), que também escreveu, juntamente com Lawrence Kasdan, e produziu ao lado do idealizador da saga, George Lucas (e Disney Pictures).
O Episódio VII marca o início de uma nova trilogia: o presidente da Disney, Alan Horn - sentado ao lado de Abrams -, anunciou que as duas novas partes da saga serão lançadas em 2017 e 2019: o Episódio VIII será dirigido por Rian Johnson, enquanto que o Episódio IX será de responsabilidade de Colin Trevorrow (“Jurassic World”), sob supervisão do próprio Abrams. Horn também anunciou o projeto de uma nova área temática de “Star Wars” a ser construída dentro de Disneyland.
“‘Star Wars: Episódio IV – Uma Nova Esperança' (1977) é talvez o filme mais influente da minha geração”, disse Abrams no evento D23 em uma sala enorme, cheia de fãs da franquia, fazendo cosplay, no Centro de Convenções de Anaheim (logo em seguida, nos encontramos novamente com Abrams na Comic-Com, em San Diego, outro ponto de encontro de fãs da saga). “Aquele filme era a personificação do bem e do mal e também a maneira com que abriu para o mundo o caminho para aventuras espaciais, da mesma forma como os faroestes fizeram com as gerações de nossos pais, isso deixou uma marca que não se apaga. Assim, de certa maneira, tudo que qualquer um de nós faça é de certa forma, direta ou indiretamente, afetado pela experiência de termos assistido aqueles primeiros três filmes.”
“George Lucas foi um gênio ao criar esse magnífico universo e preenchê-lo com tanta emoção, alma e esperança”, disse Abrams. “Assim como Lucas, também insisti em cenários reais, palpáveis para o Episódio VII e efeitos práticos on-camera, com robótica e animatrônica para proporcionar ao público a sensação de um mundo que já explorou e viu, mesmo que ainda não conheça as novas histórias que estamos em vias de contar. Quis dar uma continuidade para aquilo que Lucas começou, e que Steven Spielberg continuou e desenvolveu. ‘Jurassic Park' e seu mix de animatrônica e animação digital, ou CGI [computer graphic imagery], por exemplo, abriu novos horizontes: daquele momento em diante, foi dada a largada!”
“Não estou negando o uso de centenas de tomadas em CGI para o Episódio VII”, continuou Abrams, 50, nascido em Nova York (que mora em Los Angeles com esposa e três filhos). “Mas nosso objetivo era autenticidade e fotorrealismo; portanto, filmamos todo o exterior nos desertos reais e dunas de Abu Dhabi, para, então, movermos-nos para o interior dos Estúdios Pinewood, em Londres. Construímos centenas de criaturas robóticas que interagiram de forma magnífica com os atores, e fizemos alguns motion-capture (capturas de movimento) com a ajuda do especialista em mímica Andy Serkis. Tudo era tecnologia de ponta, impensável em 1977, no período do primeiro ‘Star Wars', ou em 1994 com ‘Jurassic Park'. Ainda assim, acredito que mantivemos um senso de lealdade e respeito em relação ao início dos efeitos especiais e da era digital.”
Abrams insiste que o lado da filmagem com efeitos especiais nunca deve ser gratuito, mas sempre estar a serviço da história. “Eu sempre gostei de trabalhar em histórias que combinassem pessoas que se relacionam com algo insano”, disse ele. “A coisa mais emocionante para mim é atravessar a ponte entre algo que sabemos que é real e algo que é extraordinário. A questão para mim sempre foi saber como atravessar essa ponte”.
“Quando eu era criança e assisti ‘Star Wars: Episódio IV – Uma Nova Esperança' pela primeira vez, senti como se minha cabeça estivesse explodindo e girando em círculos ao mesmo tempo. Eu tinha amigos que eram grandes fãs de Star Trek, e não sabia se eu era inteligente o suficiente, ou paciente o suficiente para conseguir entender. O que eu amava em Star Wars era a energia visceral do filme, sua clareza, uma espécie de inocência repleta de emoção. Star Trek sempre me pareceu um pouco mais sofisticado e filosófico, debatendo dilemas morais e coisas que eram interessantes de maneira teórica, mas, por algum motivo, não conseguia me envolver. Precisei trabalhar com todas essas pessoas e depois trabalhar de verdade com Star Trek para me apaixonar pela franquia.”
“Mas não sinto nenhum tipo de rivalidade como Coca-Cola versus Pepsi em relação à questão. Acredito que exista bastante espaço para ambos e para que essas histórias tão distintas coexistam. Sinto que sou uma pessoa de muita sorte por estar envolvido nos dois projetos. Olhando para minha infância, tenho uma lista de coisas que foram extremamente importantes para mim. Sem dúvida alguma, Star Wars estava na lista, mas não Star Trek.”
Perguntamos a Abrams sobre as novas evoluções no campo de CGI, motion-capture, animatrônica e realidade virtual no cinema, a maneira como serão implementados e sobre a convergência entre Hollywood, Vale do Silício e estúdios de especialidades como o Industrial Light & Magic, de George Lucas.
“A tecnologia, como eu estava dizendo, pode e deve ajudar no storytelling. Estou mais impressionado com a tecnologia de performance em motion-capture, aquela com o homem de lycra, a mais sofisticada interface entre homem/ator e a animação de computador. É uma forma de atuar muito pura, como diria Serkis. Você não é auxiliado por qualquer tipo de artifício ou ajudado por qualquer roupa ou maquilagem protética. Em vez disso, a captura de performance se baseia em um sistema complexo de mapeamento de movimentos registrados por múltiplas câmeras, capturados digitalmente, e finalizados por uma equipe de animadores. É uma façanha impressionante de magia cinemática que tem seduzido a indústria cinematográfica e o público da mesma forma, mas que foi incapaz de modificar atitudes em relação à autoria do papel, as linhas borradas da performance e os efeitos especiais e, em última instância, a falta de um corpo real na tela. Não é fraude com o CGI!”, disse ele rindo.
As portas tecnológicas para o futuro foram atravessadas, todos concordam com isso. Por trás das lentes de seus óculos, Abrams falou de forma animada: “Nós passamos da era do cinema mudo para a era do som, e agora estamos fazendo isso novamente. Agora que somos digitais, presumo que permanecerei digital por pelo menos 50 anos. Todas as pessoas dizem: ‘Oh, você vai substituir os atores.' Não podemos substituir atores. Nós criamos duplicatas, clones, mas eles não podem atuar. Eles são computadores, pelo amor de Deus. Se você olhar para trás, para aquilo que foi feito nos filmes de Star Wars, eles libertaram a imaginação das pessoas. Isso, claro, enriqueceu os negócios da ILM porque lhes era exigido que continuassem numa escalada crescente de tecnologia. Atores não serão substituídos: na pior das hipóteses, eles terão que usar um collant de lycra!'
E quanto àquela sua ponderação da tão anunciada e desejada tecnologia de realidade virtual: outra inevitável evolução no futuro do entretenimento? “Muita euforia em torno disso, se você quiser minha opinião”, disse ele. “Para mim, realidade virtual é uma nova ‘bolha'. Talvez não uma ‘bolha' como foi no início dos anos 1990, mas parece-me estar destinada a pequenos nichos e arenas, talvez vídeo games, pequenas produções de filmes e documentários. Há pessoas que ocupam a interseção entre Hollywood e realidade virtual que ainda estão agarradas na ideia de um futuro totalmente submerso em entretenimento. Parte dessa questão é se esse tipo de conteúdo estará disponível e perdurará com Realidade Virtual. Todos que conheço na área concordam que será um conteúdo de formato de curta-metragem, não longas. Vejo que filmes ainda serão bem-sucedidos na tela grande, telas curvas gigantescas Imax, durante um longo tempo. Com CGI, o céu é o limite, mas filmes de ação e animação sempre serão conduzidos pela história. E, para mim, o conteúdo será sempre a parte mais meticulosa e difícil de todos os efeitos especiais.”