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20 palavras para um novo mundo: Exibir

Uma série de palavras se infiltrou em nossa linguagem cotidiana este ano para descrever os novos tempos em que estamos vivendo. Pedimos a quatro grandes escritores – David Szalay, Rosie Millard, Paolo Gallo e Emma Dabiri – que escrevessem sobre algumas delas para nós. David Szalay, autor de vários livros, incluindo London and the South-East, All That Man Is e Turbulence, escreveu sobre o significado de “Exibir”. Nascido no Canadá, ele cresceu em Londres e agora mora em Budapeste

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Privados por meses de contato real com nossa família e amigos e em uma atmosfera de pânico e apocalipse generalizados, nós começamos a enviar a eles fotos do que nós estávamos comendo no jantar.

Mesmo para os anteriores padrões de exibicionismo facilitados pela mídia social, parecia uma novidade. Pessoas que nunca fizeram esse tipo de coisa antes começaram a fazer. Essa espécie de barreira caiu e, agora que caiu, ela pode muito bem continuar assim.
Mas é curiosa esta exibição que fazemos no Facebook, Instagram ou qualquer outro lugar.

Exibimos mas também escondemos.

Ou seja, exibimos apenas o que queremos exibir, e a natureza das redes torna isto mais fácil de ser feito. (Embora, é claro, às vezes aconteça de exibirmos inadvertidamente mais do que gostaríamos...)

Eu acho que o que gostamos nisto tudo é a quantidade de controle que temos sobre a imagem que mostramos ao mundo. Sentimos que podemos criar uma imagem de nós mesmos, uma imagem que nós gostaríamos que o mundo visse.

Mesmo sem perceber, começamos a pensar como as pessoas de relações públicas, comunicadores sociais, publicitários.
Se isso é particularmente bom para nossas almas eu não sei.

Entretanto, é difícil negar que há algo fundamentalmente extrovertido nisso – o sentimento particular de que existir é existir socialmente.

Que não existimos a menos que sejamos vistos.

Então, aprisionados em casa, há um desejo intensificado de declarar que ainda existimos – mesmo que apenas postando nossos pensamentos incoerentes sobre algum assunto aleatório ou uma imagem de nossa cozinha recém-pintada.

Olhem para mim! Eu ainda estou aqui!

Mas, ao menos por um tempo, também houve um tipo incomum de seriedade em nossas interações. A fofoca de costume parecia errada e não havia nenhuma fofoca de forma alguma, porque o atrito social comum e a socialização de pessoas que produzem a fofoca estavam, basicamente, ausentes. Então conversamos sobre outras coisas: sobre como o futuro se tornou tão incerto que era impossível planejar mais do que alguns dias de antecedência, sobre a forma como os governos estavam se dando poderes sem precedentes (eles os devolveriam?), sobre o medo, sobre ansiedade, sobre o tédio, sobre a solidão, sobre a morte.

Resumidamente, tínhamos o tipo de conversa e interação que nos abria um para o outro, talvez um pouco mais do que o normal. Essa, eu acho, foi a “exibição” significativa.

E então isso se transformou nesta espécie de emoção em massa. Na Grã-Bretanha, por exemplo, as repetidas rodadas de aplausos em todo o país para o Serviço Nacional de Saúde – Palmas para os Cuidadores. Em outros lugares, as performances espontâneas da sacada – algumas delas, inevitavelmente, "viralizando" na internet, aparecendo no noticiário, tornando-se um fenômeno específico, uma "cena", gerando celebridades momentâneas, incentivando um número enorme de imitadores, até a novidade passou e quisemos outra coisa.

Talvez o que tenha restado seja a sensação de que nós, todos nós, passamos por algo juntos, uma sensação de experiência compartilhada que, na verdade, é muito rara em nosso mundo fragmentado.